Os sonhos possuem o peculiar poder de engrandecer e destruir os sentimentos, ao mesmo tempo. Sonhar é livre e não paga, já ouviu essa? Sonhe, que é de graça. E deveria continuar tal qual o ditado de rua: totalmente livre.
Mas a verdade por trás de cada fechar de pálpebras tem tons tenebrosos de pesadelos em apneia, dos quais o despertar parece nunca acontecer.
Sonhos…
Busco por eles, enquanto finjo que sou feliz.
É um pouco sobre isso que Stephen King transmite em suas grandes obras. Ele te carrega nas asas majestosas de uma fada, para depois jogar-lhes nas garras do dragão, quando a realidade fica impossível de ser negada.
A coisa com o livro Conto de Fadas de Stephen King, começa ao contrário. Uma dura realidade ataca uma criança, que deveria se importar com seus guerreiros, dragões e romances a lá Disney, com a morte de sua genitora cedo demais. Um trauma imutável, que corrompe qualquer alma. E corrompeu a do pai de Charlie. O afundou no pior do alcoolismo, enquanto seu filho assistia o mundo desmoronar, aprendendo da pior forma que não existe super-herói salvador.
Compadeço-me da sua dor, Charlie. Não vivi uma perda como essa, mas entendo o que significa amadurecer antes mesmo que a biologia haja corretamente nesse sentido.
A dor nem sempre é vista em Conto de Fadas
Nos dias em que escrevi o discurso final do meu mestrado percebi nuances da jornada acadêmica as quais pensei ter superado. O fiz por ser uma boa oradora e querer passar uma grande mensagem de conclusão? De forma alguma. As frases naquele papel sangram feito artéria rompida, expulsando fluido no ritmo da pulsação cardíaca.
Linha por linha, fui tomando consciência do instante em que a camada da minha infância se rompeu. Percebi como agi para me defender dos traumas profundos abertos nos meus oito anos de vida, como apenas esqueci dos piores dias naquele apartamento, vendo meus pais brigarem; teimosos demais para entenderem que o casamento acabou.
Os resquícios desses traumas refletem hoje em dia, na ansiedade crônica, na síndrome da impostora, na necessidade de agradar e na ausência familiar que insisto em preencher de formas tóxicas. Parece bobagem quando comparados ao Gogmagog do livro, mas garanto que são tão terríveis quanto.
Conto de fadas de Stephen King: O Fundo do Poço Tem Magia
Tenho um passado bastante significativo com saltos para outro mundo através de um poço no quintal de casa, Inu Yasha está aí para comprovar. Junto com as inúmeras vezes que reassisti o anime.
Será que se eu achar um poço no final da rua de casa e me joga dentro vou para um mundo de magia também? – Quem dera…
As tramas disneyanas são capazes de me preencher de fato? A Gabriela de cinco anos atrás diria que não, ressaltando o quão infantil cada composição desse estúdio é. Mas a verdade é que ela gostaria, assim como a de agora. Hoje mais do que tudo.
Na Disney as histórias terminam com final feliz, não importa o que aconteça pelo caminho. Ao menos isso é uma certeza.
E por mais que meu traço ansioso quanto ao futuro tente dominar, o fato que perdurou minha vida no momento em que li Conto de Fadas de Stephen King, envolve a descrença da esperança e não tem outra palavra para resumir a trama. Charlie, Leah, o Outro Mundo, Radar, todos ali buscavam e nutriam esperança.
Ela ainda pode ser alcançada mesmo?
Para Empis e seus moradores, sim. Porque o enviado do destino em suas terras chegou, trazendo a salvação consigo. Ele poderia dar um pulinho na minha casa não? Só para banhar a atmosfera de: “Amanhã é um novo dia”.
Pergunto-me: quantos amanhãs suportarei antes de sucumbir?
A Sombra Iluminada da Fantasia
Engraçado… Essa resenha deve ser a mais mórbida e triste que já escrevi em toda a minha vida, mas já não dá para esconder a sombra que engoliu meus sonhos e o restinho da criança que habita meu coração.
Sou escritora – ou costumava ser – e via nas linhas recheadas de fantasia uma razão para continuar acordando todos os dias. Hoje me pergunto onde foi parar o pedaço partido dessa pessoa criativa e determinada.
Talvez soterrada de expectativas de uma sociedade doente, comandada pelo dinheiro e injusta até a última molécula de seu ser.
Se tudo isso tem a ver com esse livro? Acredito que é preciso ler para crer. Principalmente se você, assim como eu, matou a esperança em seu interior ou se perdeu de suas mãos revigorantes e nem o cheiro restou para tentar encontrá-la.
Charlie é pego desprevenido por causa de uma promessa. Tudo começou na obrigação. Então, se tornou parte integral de sua vida, que culmina em uma decisão que condiz muito com que ando tentando fazer e não tenho coragem.
Às vezes, é preciso morrer para se ter vida. Portanto, Conto de Fadas deu início ao meu funeral.
Beijos de Fogo.