O começo de uma história costuma ser como uma linha. O começo de uma reta, o início da estrada, ou qualquer assimilação que lembre continuidade e caminho. Nos livros, essa é uma etapa crucial, é quando o leitor sente a atmosfera do enredo, se insere no universo ali mostrado e cria os primeiros laços que o farão se apegar ou abandonar aquela obra.
Esses começos podem parecer organizados e bem pensados – de fato o são para os livros – mas a verdade é que são um tanto bagunçados, meio sem ser propriamente um início e sem nos avisar que existe algo começando.
A minha história, não as que escrevo, mas a que me levou a escrever, tem um “era uma vez” bem inusitado. Diferente dos relatos da maioria dos escritores clássicos, um tanto parecida com os modernos e, ainda assim, totalmente única.
Antes de tudo: você sabe o que é uma fanfic?
O universo das fanfics é um caminho sem volta.
Uma vez que se mergulha no mundo do “e se tal coisa fosse assim e não assado”, não existe mais retorno. Algo atinge nossos corações com força o bastante para nos aprisionar na necessidade de escrever a nossa visão, da forma como imaginaríamos que deveria ser.
E essa é a definição de uma fanfic: uma versão alternativa de uma história já publicada, seja livro, série, desenho, mangá ou filme.
Tinha 13 anos quando resolvi embarcar na minha primeira fanfic. Era uma otaku de primeira, animes sempre foram – e ainda são – a paixão da minha vida e se tornaram o tema para a primeira história “publicada” que escrevi.
O site que conheci foi o Anime Spirit – atualmente Spirit Fanfic –, nele a vida real desaparecia e você era imergido no mundo dos animes e RPGs de Texto. Li muitas fics de Naruto, outras de Sailor Moon e participei de muitos clãs de RPG de Texto. Esperava ansiosa que os autores atualizassem o próximo capítulo – o que acontecia, nos bons dias, uma vez por semana – e essa espera me matava. Não conseguia tirar a história da cabeça.
Eu queria viver aquela atmosfera mágica a todo instante. Precisava ser àquelas personagens, viver naqueles mundos, queria mais do que esperar o próximo capítulo. Então… resolvi fazer eu mesma.
Inu Yasha foi o anime premiado para sofrer com o impacto da minha imaginação. Tudo começou com o pensamento: “E se a Kagome fosse uma guerreira, e mais forte do que mostra no anime? Se surgisse outra guerreira, também da era atual, que a ajudasse se ser mais forte?”.
Eu lembro como se a ideia tivesse surgido agora, enquanto escrevo essa matéria para vocês. Lembro, porque o desejo de ter heroínas guerreiras protagonistas, que eu me sentisse representada, me consumia desde essa época. Estava cansada do padrão “namorada do herói” que sempre eram reservados para as mulheres nas histórias de aventura e fantasia.
Então, Kagome deixou de lado os gritos e empunhou uma espada. As coisas começaram desse jeito. O engraçado foi que consegui tantos leitores que meu perfil se tornou “mentor”, que era uma função privilegiada no site, permitindo postar histórias originais e orientar membros nos concursos que rolavam na plataforma. Bem parecido com o que hoje é o Wattpad.
Fiz duas fanfics do Inu Yasha, a primeira delas chegou a ter 40 capítulos! Só que os personagens já criados por outros não me satisfaziam mais. Outro reboliço aconteceu no meu coração.
Vozes gritavam na minha cabeça, vozes de personagens que queriam nascer, queriam contar as próprias histórias.
Então, sai das fics e passei a dar voz as minhas personagens. Assim comecei os primeiros enredos originais, que vieram em contos eróticos no início – que a cena erótica era um pingo comparada a ação e aventura – e depois exigiram espaço. Exigiram livros só para elas.
Nesse ponto do trajeto é preciso mencionar o RPG de Texto, nessa época de criação dessas personagens eu comecei uma mesa e virei mestra. No meu clã criamos nossos mundos e essa prática foi a responsável pelo nascimento das minhas obras atuais.
Meu lindo clã, que foi batizado de Rhaekyrion – daí o meu pseudônimo –, na língua antiga dos Dragões, em Ioverlar – o mundo onde se passa o conto A Serpente de Bronze –, significa a força do fogo/a força do dragão, foi e ainda é o berço das principais ideias.
Costumo dizer que o RPG de Texto foi a melhor escola de escrita da vida. O treino de escrita e criação que esse estilo exige supera qualquer curso que já fiz, técnica que já estudei e métodos de escrita que tem por aí.
Parece ter sido simples a transição da escrita de fanfic para os originais, mas houve uma latência de anos sem publicar novas histórias. Abandonei o Spirit Fanfic por falta de tempo ao entrar na faculdade e por muitos anos engavetei ideias ou as usei apenas na mesa.
Isso durou até o nascimento de Bannery Skarten, a Serpente de Bronze, em 2016, em um novo tema para o clã. Ela exigiu mais do que o RPG, ela tinha uma história para contar, ela queria desbravar o mundo, conhecer e encantar outras pessoas. Daí o sonho de ter um livro físico em mãos me cutucou.
Durante todo esse tempo escrevia para me divertir, não tinha noção do que significava ser escritora profissional ou qualquer aspecto de uma publicação. Achava que escrever e enviar o original para uma editora era algo distante, quase impossível, que até alguém ler minha história e querer publicá-la precisaria de muita insistência e muitas negações. Quase idealizava uma espécie de milagre; um dia publicaria algo nas redes e um editor leria e se encantaria tanto pelo enredo, que me procuraria para publicar a história.
A complexidade que envolver escrever e publicar livros era desconhecida. Inclusive, os editais de concurso de escrita eram desconhecidos, eu não imaginava que existiam essas coisas. Até que, em 2018, minha esposa viu uma publicação no facebook sobre um concurso na Vivendo de Inventar, que prometia ao ganhador uma publicação de livro físico e digital, mas para validar a inscrição era preciso passar por um processo preparatório gratuito, no qual conheci a escrita criativa e a narratologia, onde a carreira de escritora realmente começou.
Claro, não ganhei o concurso. Meu livro estava imaturo, assim como eu. Mesmo depois de tantos anos escrevendo. Aprendi ao longo desse processo de rejeição que crescer na literatura é uma jornada longa e contínua, não importa o somatório de experiência, sempre haverá um novo ensinamento a ser adquirido. Entrei para o curso do André Vianco e lá aprendi uma porção de técnicas e o que significa escrever com intenção. Eu era um bebê no quesito profissional, depois da Vivendo de Inventar, aprendi sobre publicação, sobre proposta para editora, sobre bookproposal, mercado editorial e o leque gigantesco que envolve a vida de um escritor.
Daí vieram os oturos cursos, a minha primeira publicação independente, a participação em vários concursos (nunca venci algum, mas um dia chego lá) e a divina publicação pela Amazon.
Mar dos Lamentos ganhou capa e páginas amareladas, se tornando meu primeiro livro publicado e depois vieram os contos que hoje estão na Amazon.
2020 me marcou muito, não só por causa da pandemia, mas porque esse caos no planeta me fez focar muito nos meus sonhos. Tive a sorte de poder ficar em casa, de trabalhar online e conseguir me manter até onde deu. Conheci pessoas incríveis, que abriram as portas para boa parte do que hoje posso dizer que é o começo da carreira.
Aprendi sobre redação para blogs, trabalhei assim por um ano e meio e aprendi muito sobre como usar a habilidade da escrita de forma comercial. Fiz pós-graduação em jornalismo digital, me aperfeiçoei em narratologia e escrita criativa, hoje sou revisora crítica e ghost writer.
E tenho alguns bebês lindos que estão saindo do forno e logo vão voar por aí, encantando pessoas com as suas histórias.
Sei que todo esse trajeto parece rápido, fácil e feliz, mas foi muito difícil. Foi longo, sofrido, triste e muitas vezes pensei em desistir. A estrada é tortuosa, pedregosa, cheia de buracos, mas foi o caminho que escolhi e amo, apesar dos momentos conturbados.
Escrever é um processo. Aprendi que é como uma maratona, não é a velocidade que ganha, mas a resistência. Vivo essa corrida eterna no ritmo mais saudável para mim, acompanhada, boa parte do tempo, por dragões.
Beijos de Fogo.
Pingback: Resenha A Acompanhante: A Leveza de Um Quase Primeiro Amor - G. M. Rhaekyrion
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